segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Qual é o seu armário?

Sábado, dia 27 de agosto, aconteceu em BH a 7ª Caminhada pela Visibilidade Lésbica.
Desde algum tempo, venho participanto de diversos movimentos de luta contra a homofobia e a lesbofobia, e não poderia faltar à caminhada.
Chegamos na Praça 7 por volta das 14 horas, e ainda havia poucas pessoas na praça. 
Faixas e cartazes, em frente ao McDonalds, no mesmo dia do "McLanche Feliz" (feliz pra quem, cara-pálida?) e as pessoas passando, em uma tarde de sábado, voltando do trabalho, ou das compras ou indo para o templo do consumo do shopping Cidade... 
Reações diversas.

A caminhada começou por volta das quatro e meia da tarde, e foi curta, mas muito válida!

Mas não é sobre a caminhada que decidi escrever hoje.
No domingo, é dia do almoço em família. 
Fui para a casa dos meus pais, onde ajudei a fazer o almoço, e enquanto isso, tomava uma cerveja com minha mãe, na cozinha.
Ela me perguntou sobre o sábado, o que eu havia feito, essas coisas.
E eu disse que fora a uma caminhada.
Ela imediatamente perguntou se era dessas coisas de gays que eu ando frequentando (palavras dela). 
E eu disse que não era de gays, era de lésbicas, e sim, foi uma caminhada dessas.
Ela me olhou e disse:  "Minha filha, pode parar com isso!" 
Com um tom de preocupação e, não sei, advertência?
Talvez nem ela saiba o que desejava expressar com aquelas palavras.



Respondi para ela:
"Mãe, eu não sou lésbica. Mas tenho amigas que são, e uma delas, uma menina incrível, advogada, inteligentíssima, superbacana, esta passando por uma situação tão triste... os pais da namorada, que tem vinte anos, descobriram sobre o namoro e as proibiram de se ver. Imagina que tristeza??"

Minha mãe não é uma pessoa ruim. É conservadora, de família criada nos dogmas do catolicismo e naquilo "que os outros irão pensar-dizer". 
Depois da minha resposta, ela concordou que é um absurdo as pessoas serem proibidas de viverem juntas, de namorarem, de se amarem e demonstrarem isso. 
Mas ao mesmo tempo, quando vê os casais homossexuais nas novelas, ela ainda acha um absurdo, acha que "incentiva". Todos os dias que falamos sobre o tema, eu tento fazer com que ela supere o que lhe foi incultido durante décadas, pela família e pela igreja, e passe a sentir empatia.






Me pego pensando: nunca é cedo demais para aprender que meninas usam rosa e meninos usam azul, que meninas brincam de boneca e tem que ser magras e delicadas, e meninos jogam bola e brigam, e tem que ser fortes e atléticos.
Nunca é cedo demais para reproduzir sem perceber os conceitos culturais que foram construídos e que tanto afetam tanto as crianças como os adultos.
Por que discutir a diferença e o respeito pela diversidade seria "precoce" em jovens a partir de 14 anos, que seria o foco da campanha anti-homofobia?

Lésbicas sofrem preconceito todos os dias.
São visíveis somente para o fetiche do prazer masculino.
Campanhas com duas mulheres não empoderam as lésbicas, mas apenas "deleitam" os olhares masculinos, usando apenas de um padrão estético que oprime todas as mulheres, homossexuais ou não.
 


Eu não sei o que é ser lésbica, assim como não sei o que é ser negra. Mas sou capaz de sentir a dor do Outro.
Sou capaz de reconhecer e aceitar a diferença. 
E sou capaz dessa empatia, mesmo tendo sido criada em uma família tradicional.
Então, em certos momentos, perco totalmente a fé na humanidade.
É muita maldade, muita cegueira voluntária, muita estupidez.
Mas em outros, ainda consigo ver que existem pessoas que fazem o bem, pessoas que reconhecem a existência do Outro como semelhante, como iguais, como irmãos.

E nesses momentos, penso em que é que realmente está no armário embolorado fedendo naftalina...



Armário - Zeca Baleiro
Lembro quando você me falou,
dentro do armário,
só tem bolor e naftalina.
Vem já pra fora, meu bem,
que só aqui é que tem,
calor e adrenalina.

Voltei pra casa,
parei na porta,
pensei um pouco...
Nem morta!

Não posso, não posso,
já falei que eu não posso,
não é que eu não queira,
mas é tão difícil pra mim.

É claro que eu quero,
quero mais que tudo,
mas sinto tanto medo,
um medo absurdo!

Medo dos vizinhos,
medo da mommy,
medo do daddy,
e do meu irmão,
que já foi skinhead.

Oh, meu amor,
ninguém me faz tão feliz,
ninguém me fez tanto bem...

Mas já que eu não posso sair do armário,
peço que você entre no armário também...

Não posso, não posso,
já falei que eu não posso,
não é que eu não queira,
mas é tão difícil pra mim.

É claro que eu quero,
quero mais que tudo,
mas sinto tanto medo,
um medo absurdo!

Medo dos vizinhos,
medo da mommy,
medo do daddy,
e do meu irmão,
Que já foi skinhead.

Oh, meu amor,
você é tudo de bom,
ninguém me fez tanto bem...

Mas já que eu não posso sair do armário,
Peço que você entre no armário também...
 
Este singelo post foi escrito para a Blogagem Coletiva da Visibilidade Lésbica, convocada pelas Blogueiras Feministas.

Dê uma olhada lá, nas postagens das demais blogueiras participantes, e blogueiros também.
Mas não deixe de ler os posts da Inquietudine. São um alento, apesar da revolta que provoca ver uma pessoa incrível ter que enfrentar tantos obstáculos simplesmente para amar... 
Já pensou nos seus privilégios, hoje??

2 comentários:

  1. Bacana a postagem companheira, a vida para os militantes é assim "Desconstruindo rótulos e rompendo barreiras" todos os dias, são raros os que compadecem com nossa dor com nossa luta!

    A NOSSA LUTA É TODO DIA, SOMOS MULHERES E NÃO MERCADORIA!

    Saudações!!!

    ResponderExcluir
  2. Ô sua linda! Muito obrigada pelas palavras! Adorei o post!
    E acho que é isso mesmo, a gente tem que ir do jeito da gente tentando desconstruir o preconceito, assim como vc tenta com sua mãe. A luta é de todos nós, todos os dias e em qualquer ambiente. Nunca é cedo o tarde demais pra construir um mundo melhor! E incrível é você, querida! =***

    Beijões!

    ResponderExcluir