quarta-feira, 28 de setembro de 2011

O direito ao aborto legal e seguro é direito da mulher

Cartaz da campanha de 2010, em Buenos Aires - Argentina (Foto: arquivo pessoal)

28 de setembro: Dia Latino americano pela legalização do aborto

Somente em 2010 tomei conhecimento desta data de luta, luta feminista, mas, mais que tudo, luta de qualquer pessoa que se considere defensora de Direitos Humanos.

A criminalização do aborto, no Brasil, mostra uma das faces mais cruéis do preconceito de classe e de gênero.

Mulheres de condição social mais elevada, com poder aquisitivo maior, há décadas podem realizar procedimentos seguros de interrupção da gravidez. As vítimas da criminalização do aborto são as mulheres pobres, moradoras de regiões sem recursos médicos, na maioria das vezes, negras. E sempre, as mulheres.

Seja ela vítima de um estupro, quando é "beneficiada" pelo artigo 28 do Código Penal, aquele que diz que "não se pune" o aborto praticado por médico, se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

 Não se pune, mas ainda é crime. Não se pune o médico. Mas a mulher, que foi vítima de estupro e engravidou em consequência, é punida de várias formas. Além de ter que passar pelo crime, terá que enfrentar a escolha de ter ou não o filho, sofrendo interferências mil, nessa decisão, que é pessoal, e não deveria ser submetida ao crivo de julgamentos morais e linchamentos religiosos.

Existe uma banda, em Minas Gerais, chamada "Tia Nastácia". Tocam rock, são desbocados, irreverentes, fazem até um som interessante. Nunca estouraram nacionalmente, mas tem um número razoável de fãs nos redutos. 

Pois não é que um dia, ouvindo uma coletânea de MP3 com a discografia, me deparei com uma música que se chama "Fazedora de Anjos", e trata de uma crítica ao abortamento? 

"Dor de alma como dói
Sofrimento é ganhar pão
E alma do anjinho chora
Que viu chegar sua hora
Entre porquês e razões


Ô mãe! Eles me aspiraram
Ô mãe! Você deixou curetar
Ô mãe! Me arrancaram em pedaços
Mamãe! Eu nem pode chorar."


Incrível. Não preciso dizer quão enorme foi meu desapontamento, ao perceber que eu um reduto que se pretende, digamos, contestador, os argumentos são contra a interrupção volutária da gravidez, e mais ainda, usam dos mesmos adjetivos dos fundamentalistas cristãos e ativistas "pró-vida".Anjinhos, bebês, a epítome "mãe" como o sinônimo de tudo o que é belo e tudo a que uma mulher pode e deve aspirar a ser.


Ano passado escrevi um post sobre o tema
No decorrer destes 12 meses, tivemos a eleição de uma mulher para a presidência da República. Uma mulher, eleita por um partido que se comprometia a discutir o tema do aborto e da descriminalização.
Tivemos um julgamento histórico, nas questões homoafetivas, que foi o reconhecimento da união estável aos casais do mesmo sexo.
Outro julgamento reconheceu que as "Marchas da Maconha" são legítimas manifestações da liberdade de expressão e manifestação.
A passos de tartaruga, algumas questões tem evoluído.
Mas, um ano depois, não houve nenhum avanço significativo na questão da legalização da interrupção voluntária da gravidez.
Ainda morrem centenas de mulheres (pobres) em decorrência de procedimentos rudimentares, sem condições de assepsia ou cuidados médicos adequados.
Ainda há um comércio muito lucrativo de medicamentos abortivos, para aquelas que podem pagar.
E ainda existem propostas no sentido de estipular que a vida em potencial, do nascituro, tem maior proteção que a vida de fato e de direito, da gestante

 Doloroso ler alguns textos de ativistas "pró-vida" e ler que o procedimento seria permitido "a qualquer momento da gestação", quando todos sabemos que não é assim que funciona, que um aborto legal tem um período para ser realizado, e que a mulher, desesperada, que aborta aos seis meses, o fará com ou sem a permissão do Estado, da igreja, da família. Porque essa mulher se vê sem opção. Porque essa mulher é pobre, muitas vezes é negra, e a questão da adoção no Brasil passa por tantas mazelas quanto qualquer outra questão social e de saúde pública. 

O direito ao aborto legal e seguro é direito da mulher. 
Porque ele faz parte de plataformas feministas, outras pessoas o disseram melhor do que eu poderia dizer agora. 


Campanha da Articulacion Feminista Marcosur
A mulher é sempre a responsável pela concepção. Seja ela casada, solteira ou vítima de estupro, sobre ela (nós) recaem as cobranças quanto a se "proteger" seja da gravidez, seja do estupro. Ensinam a mulher a temer, a agir de forma sorrateira, porque a discussão, no espaço público, de quais são as verdadeiras consequências de determinados atos, são, ainda, muito exclusivas do gênero masculino, e mesmo, de um olhar masculino. 

Ainda, no Brasil, como país eminentemente católico, temos a inaceitável interferência de lobbys religiosos em todos os aspectos da administração pública, em especial, no que se refere ao âmbito das relações íntimas (questões homoafetivas) e de saúde pública, no que tange à saúde da mulher, especificamente. A visão das igrejas sobre as mulheres ainda deixa muito a desejar.
Mas tudo bem. Se eu quero mudar a igreja, eu que participem, estude, questione. Ou não: eu que me acomode, porque afinal está na Bíblia que mulher tem que ser submissa, etc et al. 
Mas, se eu não participo, não quero ter nada a ver com instituições religiosas, e sou cidadã de um estado laico, que deveria prover os direitos e garantias indivíduais de todos, independente de opção religiosa, porque sou obrigada a me submeter aos ditames religiosos? E pior, aos ditames religiosos de dogmas estabelecidos por homens, sem participaçao ou debate feminino?
Sei que existe o "Católicas pelo Direito de Decidir", bem como outras organizações religiosas que apóiamo os movimentos pró-escolha.
Mas no geral, o que vemos é um fanatismo absurdo, e incoerente, que afeta, todos os anos, milhares de mulheres, no Brasil, privadas de seu legítimo direito à interrupção volutária da gravidez.

Este post foi elaborado em atendimento ao chamado para a Blogagem Coletiva: Pela Descriminalização e Legalização do Aborto

Um comentário:

  1. eu sou à favor, existe pessoas que tentam reprimir essa legalização dizendo: "que pena que sua mãe não pensou assim" então eu penso: "que pena mesmo, pq eu minha mãe me abandonou, pq cresci em uma familia que não é minha, pq dói ver minha mãe adotiva fingir gostar de mim" há pouco tempo passei por uma situação descobrir esta grávida logo no primeiro mês e não pensei duas vezes, foi doloroso, foi triste e ainda é, mas seria muito mais se eu tivesse seguido em frente, além da represália que eu iria sofrer por parte da minha familia adotiva e não conseguiria amar este, eu não sei o que é amor de mãe pois o prêmio que eu recebi por nascer foi ser abandonada, então como eu poderia amar um filho, se eu nunca soube o que é ser amada por uma mãe? Sou a favor principalmente pq ninguém sabe o que se passa na vida e na cabeça de uma mulher.

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