domingo, 30 de maio de 2010

Abordagem policial em questão

Um colega me falou sobre um programa chamado Cops, transmitido pela Tru TV.

Na madrugada de sábado passado, chegando em casa, liguei a tv, e olhando o guia de programas, vi que estava passando o tal programa no tal canal.

Não tive paciência de assistir, mas vi que em seguida, iria ser transmitido outro, de nome "Inside American Jail" (Centro de Detenção, na programação brasileira) um programa que acompanha o que acontece nas prisões. "Getting busted is just the beginning": ser preso é só o começo...

Gente, é uma das coisas mais ridículas, humilhantes, patéticas, que já vi na vida.

Fiquei pensando: será que os presos se sujeitam a tal exposição voluntariamente, ou seja, será que são consultados e assinam um termo autorizando a exibição das imagens, ou será que, na ótica do "quem é preso não é gente = não tem direitos", não importa se eles concordam ou não com a filmagem e posterior exibição?

Por associação de pensamento....

Lembrei de um vídeo que exibo nas aulas de Direitos Humanos, sobre uma abordagem policial que termina com a condução do "elemento".

O programa é apresentado por um tal de "Bocão", e começa com o sujeito prestando um desserviço à segurança pública, ao validar comportamentos violentos em abordagens policiais.

Poderia fazer diferente?

Sim, poderia ajudar às policias e à população, mas não, tem que dar um tom sensacionalista e populista ao ocorrido, então...

Como ele poderia prestar um serviço?

Bem, primeiro explicando ao telespectador que a Polícia (as polícias) não estão de "perseguição" com ele, e que a abordagem, no caso em tela, não foi aleatória. Ora, se a pessoa desce do ônibus e apressa o passo ao visualizar a presença de policiais, pode muito bem estar tentando evitar a abordagem, por portar algo ilícito, como drogas ou armas, ou ser foragido, por exemplo (claro, pode ser que quem já seja "escolado" no crime as vezes fica tão "relax" que nem é abordado... são coisas da vida, policial não é oráculo de Delfos, para saber o que aconteceu e o que acontecerá só de olhar para a cara da pessoa).

Segundo, explicar, de uma maneira sensata, que não, náo é legal “tomar tapa”, mas sim, é legal e deve ser obedecida a ordem de colocar as mãos na cabeça ou na parede, abrir as pernas em determinado ângulo, ficar imóvel, ser revistado, ter a bolsa revistada (não revirada e jogada no chão...). Inclusive, se houver necessidade, é possível que uma mulher seja revistada por um homem, sim. Não em qualquer caso, mas em determinadas hipóteses, que quem vai determinar é sim o policial!

Explicar que é desconfortável sim, é constrangedor, sim, mas se a gente não estiver portando nada (arma, droga, chave micha, etc.), e aguardarmos, ao final seremos liberados e ouviremos o policial (em geral um militar, praça, claro!) agradecer a colaboração (bem, esse é o procedimento padrão, não posso garantir que na rua funcione assim em todos os momentos, infelizmente!)

Só que não: o Bocão só fica parabenizando os militares, que agiram totalmente errados a partir do momento em que houve a desobediência. Ora, se ele não obedeceu, deveria ser imediatamente imobilizado, revistado, e em seguida, aí sim, conduzido à delegacia (onde vai ser lavrado um TCO, e não concepção popular, “não dá em nada”,mas isso é outro assunto). Da forma como ocorreu, o cidadão (ou, nas palavras da Tenente, "o elemento") teve várias oportunidades de reagir e provocar graves consequências, por exemplo, tomando a arma de um policial, podendo ferir a si, a terceiros e ao próprio policial.

Houve desobediência? Creio que houve, sim. (Desacato? Acredito que não. Resistência? Tampouco.)

Só que culpado por ela não é só o cidadão, mas o policial, a mídia e a sociedade brasileira. Ninguém sabe como agir, ninguém sabe como se comportar em uma situação de abordagem. Ninguém discute o que deve ser falado: quais os limites do mandado policial? Quais os deveres do cidadão?

Polícia é controle. É ruim? Eu acho também, ninguém quer ouvir "não", e controlar é dizer não para os instintos, para alguns desejos, para algumas pulsões. Temos várias ferramentas de controle, internas e externas, e a Polícia, em qualquer lugar do mundo, sendo a força armada interna do Estado ( e sendo o Estado o baluarte da sociedade moderna, "civilizada", ou seja, aquele a quem delegamos as funções de proteção e controle") é, obviamente, CONTROLE.

Polícia pode usar arma, sim. Em qualquer caso? Não, claro que não!

O uso da arma tem o potencial de letalidade, que só é justificável para legítima defesa (própria ou de terceiros).

E, gente, se quando ocorre um desvio de conduta de um policial, em qualquer ligar, seja no Rio, no Pará ou no Paraná, e passa no JN ou outro similar, isso repercute sobre a imagem de TODAS as POLÍCIAS e TODOS os POLICIAIS (sejam Policiais Civis, Policiais Militares, Guardas Municipais ou Agentes Penitenciários), eu passei a entender que quando morre um policial em confronto em qualquer lugar, isso repercute também sobre os policiais, que convivem diariamente com a criminalidade violenta e correm sim, risco de morrer em serviço!

Mas, voltando ao vídeo da abordagem policial, e concluindo, nossa sociedade não sabe como se comportar. O “cidadão de bem” costuma ser o que mais causa os “pequenos transtornos” do cotidiano, porque, na cabeça dele, deveria ser obvio ao policial que ele (o tal cidadão de bem) não é “bandido” e não precisa ser abordado, ainda que tenha ocorrido um roubo minutos antes, naquela região, e a descrição do autor e da roupa seja similar à dele (cidadão de bem).

O policial deveria saber que não precisa abordá-lo em fiscalização blitz, e nem pedir os documentos, porque ele é um cidadão honesto, seus impostos pagam os salários dessa corja de policiais corruptos, e ... opa! Não pagou o licenciamento de 2010. Ahm, seu guarda, sabe o que que é...

A violência policial é legitimada por uma classe, pela classe dominante, uma vez que em geral não a atinge!

A policia no Brasil continua matando ( e morrendo) em níveis alarmantes, mas isso não importa para uma sociedade que quer a todo custo se manter isolada da “marginalidade”.

Transcrevo ao final um trecho da fala inicial do apresentador (sério, assiste o vídeo, ele fala isso mesmo, e gesticulando!)

“Abordagem é normal: mão na cabeça e abre as pernas! Vai sacudir tudo, por baixo e por cima! Não tem conversa! E é com rico, com pobre, com preto, com branco! E olhe, se cair numa blitz irmão meu, primo meu, e falar – Ah, eu sou irmão de Bocão... – bolacha logo: pau! Quem mandou dizer que é irmão de Bocão?”

Então já viram,né?

Nada de ser parado na blitz e dizer que me conhece! hahahaha

2 comentários:

  1. Fui abordado hoje... Pensei que seria bom se as coisas realmente acontecessem como vc descreve.

    Escrevi um texto sobre... e imagino qeu vc va dizer que é exeção a regra. Conheço pessoas que confirmam que é a regra...

    Bjos, boa noite.

    Thiago Beleza

    ResponderExcluir
  2. Não, Thiago, não vou dizer que é a exceção. Gostaria que fosse.
    Deixei uma resposta no seu blog.
    Bjo e boa tarde!

    ResponderExcluir